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Referência Bibliográfica


GOMES, A. (2013) - História eruptiva do Sistema Fissural dos Picos e avaliação da susceptibilidade a escoadas lávicas (Ilha de S. Miguel, Açores). Tese de doutoramento no Ramo de Geologia, especialidade Vulcanologia, Departamento de Geociências, Universidade dos Açores,352p.​

Resumo


As erupções vulcânicas, não sendo, regra geral, dos perigos geológicos que ocorrem com maior frequência provocam, normalmente, significativos impactes sociais, económicos, culturais e ambientais em função do local onde ocorrem, do tipo de evento e sua magnitude.

 

O arquipélago dos Açores, localizado no Oceano Atlântico Norte, foi palco de várias erupções históricas, de natureza e magnitudes variadas. A ilha de São Miguel, a maior tanto em área (aproximadamente com 746 km2) como em número de habitantes (137.699 pessoas, cerca de 57% da população do arquipélago), possui cinco sistemas vulcânicos activos, sendo três materializados por vulcões centrais com caldeira (Vulcão das Sete Cidades, Vulcão do Fogo e Vulcão das Furnas) e dois pautados por cones de escórias e escoadas lávicas (Sistema Vulcânico Fissural dos Picos e Sistema Vulcânico da Achada das Furnas). Desde o seu povoamento, em meados do séc. XV, ocorreram seis erupções nesta ilha, tendo cinco delas sido marcadamente explosivas e uma de carácter predominantemente efusivo.

 

As escoadas lávicas basálticas, produto vulcânico comum das erupções do tipo havaiano e estromboliano, têm, normalmente, impacte mais reduzido, em termos de área, que o provocado por produtos piroclásticos de queda e de fluxo. Não obstante, existem alguns exemplos onde a dispersão e/ou velocidade de desenvolvimento das escoadas lávicas tiveram efeitos consideráveis, de entre os quais se salientam as erupções de Laki (Islândia), em 1783-84, e do Vulcão Nyiragongo (República Democrática do Congo), em 1977. No caso concreto de São Miguel, o Sistema Vulcânico Fissural dos Picos (SVFP) corresponde ao mais jovem e activo sistema basáltico da ilha, nele se tendo localizado as erupções históricas de 1563 e 1652. Durante a erupção de 1563, no Pico do Sapateiro ou Queimado, foram geradas escoadas lávicas basálticas (s.l.), cujo desenvolvimento atingiu a localidade da Ribeira Seca, na costa N da ilha, enquanto a mais recente, marcadamente explosiva, teve a particularidade de envolver um magma mais evoluído, invulgar no magmatismo que caracteriza o SVFP.

 

O presente trabalho versa sobre o estudo do SVFP, o qual possui como limite a W o Vulcão das Sete Cidades e a E o Vulcão do Fogo. Este sistema é caracterizado por apresentar declives suaves a partir de uma zona central definida por dois eixos principais, paralelos, de centros eruptivos monogenéticos basálticos (s.l.), de direcção geral NW-SE, e a partir dos quais se desenvolvem escoadas lávicas para N e para S.

 

A vulcanoestratigrafia do SVFP foi analisada tendo por base os trabalhos de outros autores e a realização de novos levantamentos geológicos, utilizando-se como níveis de referência depósitos piroclásticos de natureza traquítica gerados nos últimos 5.000 anos nos vulcões centrais adjacentes. Conclui-se que o depósito Sete-P8, gerado no Vulcão das Sete Cidades, tem uma idade superior a 2780±80 anos (B.P.) e que o depósito Sete-P9, do mesmo edifício vulcânico, se formou entre os 2700±250 anos (B.P.) e os 2200±70 anos (B.P.). Adicionalmente identificou-se e caracterizou-se um depósito pomítico com dispersão na área da cidade de Ponta Delgada, com idade radiométrica de 12.300±50 anos (B.P.), que se denominou por PDL. As correlações vulcanoestratigráficas efectuadas permitiram estabelecer uma nova escala vulcanoestratigráfica para o SVFP.

 

Tendo em vista a análise da susceptibilidade ao desenvolvimento de escoadas lávicas no SVFP, foram efectuados vários ensaios utilizando o programa de simulação VORIS para se determinarem os valores mais adequados para os parâmetros de modelação. Neste contexto, optou-se por utilizar um modelo digital de terreno com célula de 50 metros e considerar como áreas fonte todos os centros eruptivos identificados e as estruturas tectónicas. As simulações foram realizadas admitindo-se o desenvolvimento de escoadas lávicas com comprimento de 12 km, isto é, com uma extensão suficiente para atingirem a linha de costa, e uma espessura de 10 metros. Cada simulação envolveu a realização de 4.000 iterações. O mapa de probabilidade de inundação obtido serviu de base à elaboração de uma carta considerando a existência de cinco classes de susceptibilidade no que respeita à área de inundação de escoadas lávicas geradas no SVFP. Constatou-se que 0,3% (2 km2) da ilha possui susceptibilidade muito baixa, 2% (15 km2) tem susceptibilidade baixa, 8% (59 km2) possui susceptibilidade moderada, 26% (cerca de 193 km2) tem susceptibilidade elevada e 0,02% (0,2 km2) possui susceptibilidade muito elevada. No global, a área de influência de escoadas lávicas produzidas no SVFP corresponde a cerca de 36% (269 km2) da ilha.

 

A metodologia utilizada para a análise da susceptibilidade ao desenvolvimento de escoadas lávicas no SVFP pode ser aplicada aos restantes sistemas vulcânicos do arquipélago dos Açores, o que implicará a redefinição da escala de susceptibilidade agora apresentada para uma dimensão regional.

 

A maior cidade do arquipélago, Ponta Delgada, desenvolve-se sobre o SVFP. No seu perímetro urbano vivem cerca de 20.600 pessoas, ou seja, cerca de 15% do total da população residente na ilha, e nele estão edificadas diferentes infraestruturas críticas, tais como o hospital, o aeroporto e o maior porto de São Miguel. A exposição de elementos vulneráveis ao desenvolvimento de escoadas lávicas teve por base a análise da sua localização à luz do mapa de susceptibilidade. Verificou-se que na área de influência de escoadas lávicas basálticas (s.l.) geradas no SVFP residem 104.799 pessoas, ou seja cerca de 76% do total da população da ilha de S. Miguel. Cerca de 82% das áreas urbanas e das vias de comunicação terrestres das 32 freguesias em apreço encontram-se edificadas em zonas com susceptibilidade elevada, assim como diversas infraestruturas básicas. Relativamente à ocupação do solo, cerca de 87,5% das áreas industriais, 74% das áreas agrícolas e de pastagens e mais de 57% das áreas florestais e de vegetação natural encontram-se, igualmente, em zonas com susceptibilidade elevada. Embora o desenvolvimento de escoadas lávicas a partir de um centro ou fissura eruptiva, nunca venha a ter uma dispersão tal que ponha em perigo toda a extensão da área identificada como susceptível, certo é que a localização de importantes áreas urbanas e diversas infraestruturas críticas na área de influência deste sistema vulcânico levam à conclusão que mesmo uma erupção de baixa magnitude pode ter um impacte social, económico e cultural significativo à escala da ilha e com repercussões que se podem estender a outras ilhas do arquipélago.

 

No que respeita à análise da susceptibilidade e da exposição ao desenvolvimento de escoadas lávicas, as abordagens utilizadas no decorrer deste trabalho foram orientadas para a vertente de ordenamento do território. Não obstante, os mapas obtidos constituem uma boa base de trabalho para o planeamento de emergência e a produção de cenários eruptivos passíveis de serem utilizados no âmbito de exercícios de protecção civil.

Observações


Anexos