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em Vulcanologia e Avaliação de Riscos
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Referência Bibliográfica


CARMO, R. (2013) - Estudos de neotectónica na ilha de S. Miguel, uma contribuição para o estudo do risco sísmico no arquipélago dos Açores. Tese de Doutoramento no Ramo de Geologia, especialidade em Vulcanologia. Departamento de Geociências, Universidade dos Açores, 307p.​​

Resumo


Dada a sua localização no extremo SE do Rift da Terceira (s.l.), uma estrutura difusa em regime transtensivo direito que marca o sector ocidental da fronteira de placas Eurásia-Núbia, a deformação a que a ilha de S. Miguel está sujeita encontra-se bem representada por numerosas falhas activas, ao longo das quais se regista sismicidade e vulcanismo frequente. A ilha de S. Miguel resulta da edificação de vários sistemas vulcânicos, compreendendo três vulcões centrais activos (Sete Cidades, Fogo e Furnas) interligados por zonas de vulcanismo fissural (Picos e Congro) e um sector mais antigo correspondente ao Vulcão da Povoação e ao Sistema Vulcânico do Nordeste.
 
As estruturas tectónicas mais desenvolvidas têm direcção NW-SE (300-330º) a WNW-ESE (280-300º) e apresentam movimentação normal por vezes associada a desligamento direito. Estão expressas morfologicamente por escarpas de falha, que constituem importantes estruturas distensivas, e por alinhamentos vulcânicos. Embora menos frequentes, ocorrem também acidentes N-S a NNW-SSE (330 350º) com cinemática normal associada a desligamento esquerdo. Estes estão materializados por alinhamentos vulcânicos menos extensos e por troços rectilíneos de linhas de água e de arribas litorais. Ambas as famílias apresentam inclinações em sentidos opostos, padrão característico de deformação tridimensional.
 
A distribuição espacial das direcções estruturais à escala de ilha não é homogénea, mostrando antes que, de W para E, ocorre uma rotação na orientação das estruturas de NW-SE para WNW-ESE, e de N-S para NNW SSE. No Vulcão das Sete Cidades, as falhas exibem direcção preferencial NW-SE, sendo particularmente evidente no flanco NW através das escarpas de falha que formam o Graben dos Mosteiros, e o sistema conjugado apresenta direcção N-S. Aquela importante estrutura distensiva cruza todo o edifício vulcânico das Sete Cidades e prolonga-se para SE para o Sistema Vulcânico Fissural dos Picos, onde está expressa por numerosos alinhamentos vulcânicos e fissuras eruptivas dispostos en échelon direito, definindo duas cristas vulcânicas principais. Ainda que estas duas zonas de fractura exibam direcção geral NW-SE, verifica-se que para leste, à medida que se aproximam do Vulcão do Fogo, os centros eruptivos monogenéticos tornam-se mais dispersos parecendo reflectir a presença de um acidente profundo orientado E-W. No Vulcão do Fogo, a situação torna-se mais complexa. No flanco N, as estruturas dominantes apresentam direcção NW-SE a NNW-SSE e estão materializadas pelos alinhamentos vulcânicos que limitam o Graben da Ribeira Grande e por lineamentos deduzidos do padrão da rede de drenagem. Na zona da caldeira, ocorrem estruturas com direcção aproximada E-W, enquanto que no flanco S, as falhas orientam-se preferencialmente segundo as direcções N-S e NE-SW. Para leste, o sistema tectónico principal exibe direcção WNW-ESE, estando evidenciado pelos alinhamentos vulcânicos do Sistema Vulcânico Fissural do Congro, atravessando o Vulcão das Furnas. No Sistema Vulcânico do Nordeste está expresso pelas escarpas de falha que constituem o Graben de Água Retorta.
 
Esta rotação parece reflectir a influência de uma importante estrutura de direcção E-W em profundidade, provavelmente relacionada com falhas que cortam o soco oceânico, paralelas às falhas transformantes. Esta hipótese é suportada pelo alinhamento E-W definido pelos vulcões do Fogo, das Furnas, da Povoação e do Nordeste, e pela presença de falhas com esta direcção na área da caldeira do Vulcão do Fogo e no Sistema Vulcânico Fissural do Congro, como as falhas do Altiprado.
 
Ao longo de toda a ilha é possível reconhecer, ainda, falhas de direcção NE-SW (30-60º), com mergulhos para NW e SE, a afectar unidades de idades diferentes. No entanto, o seu significado ao nível da tectónica regional continua por esclarecer. Estas estruturas são particularmente evidentes no Vulcão das Furnas onde, a par com as estruturas WNW-ESE, parecem controlar a forma das caldeiras. A presença de estrias em planos de falhas do Vulcão das Furnas e da região Povoação-Nordeste permitiu verificar que este sector é caracterizado pela existência de quatro famílias de falhas principais: falhas NW-SE a WNW-ESE com movimentação oblíqua normal direita conjugadas de estruturas tectónicas NNW-SSE com cinemática oblíqua normal esquerda, e falhas NW-SE a WNW-ESE com movimentação oblíqua normal esquerda conjugadas de acidentes NE-SW com cinemática oblíqua normal direita. Cada uma destas famílias é composta por dois conjuntos de falhas inclinando em sentidos opostos, situações típicas de deformação tridimensional, e indicativas de dois campos de tensões distintos que devem alternar no tempo. O primeiro conjunto de falhas conjugadas é compatível com o campo de tensões actual transtensivo definido para a região dos Açores, com σ1 horizontal e orientado NW-SE, σ3 horizontal e orientado NE-SW, e σ2 vertical. O segundo conjunto de estruturas conjugadas indica um campo de tensões com σ1 horizontal e orientado E-W, σ3 horizontal e orientado N-S, e σ2 vertical.
 
No Vulcão das Furnas foi também possível constatar a ocorrência de falhas N-S com estrias a indicar movimentações normal e oblíqua normal direita, sendo interpretadas como resultantes de um campo de tensões local relacionado com o edifício vulcânico.
 
O controlo tectónico sobre o vulcanismo está bem evidenciado pelo sistema regional no caso das zonas de vulcanismo fissural, enquanto que ao nível dos vulcões poligenéticos, a este sistema se adicionam outras direcções tectónicas, quer resultantes de campos de tensões relacionados com processos vulcânicos, quer associadas a estruturas mais antigas (i.e. E-W).
 
A recolha da informação neotectónica disponível permitiu estimar taxas de deslizamento, deslocamentos por evento e comprimentos de rotura para algumas estruturas tectónicas, parâmetros fundamentais para avaliar a magnitude do sismo máximo expectável e o grau de actividade das falhas, usando as correlações empíricas de Wells e Comppermith (1994) e a classificação de Matsuda (1975 in Slemmons, 1977), respectivamente. As taxas de deslizamento variam entre 0.003 e 3.37 mm/ano, mostrando que as falhas identificadas podem classificar-se desde acidentes com baixa actividade a muito activos. No que respeita ao potencial sismogénico, as falhas presentes na ilha de S. Miguel têm potencial para causar rotura superficial durante sismos puramente tectónicos e de magnitude elevada, e/ou durante a actividade sísmica associada a episódios de reactivação vulcânica, e com magnitude baixa a moderada. O comprimento e a área de rotura, considerando uma espessura da crosta sismogénica de 8 e 14 km, indicam magnitudes de momento variáveis entre 4.9 e 6.6, enquanto que o deslocamento por evento sugere magnitudes mais elevadas (MW 5.7-6.9).
 
A abertura de trincheiras com vista a estudos de paleossismologia em duas estruturas tectónicas do Sistema Vulcânico Fissural do Congro, as Falhas Altiprado 1 e 2, permitiu confirmar a sua natureza tectónica, datar episódios de rotura superficial e respectivos deslocamentos. Os dados obtidos mostram que estas estruturas sofreram vários episódios de rotura superficial em período histórico, relacionados com sismos de natureza tectónica de magnitude mais elevada ou durante períodos de incremento de actividade sísmica, de magnitude baixa a moderada, associados a fenómenos vulcânicos. Na Falha Altiprado 1, foi possível, ainda, associar um deslocamento de 1 m ao sismo histórico de 1522, um dos mais destrutivos do arquipélago dos Açores, equivalendo a uma magnitude de momento de 6.7. Por outro lado, na Falha Altiprado 2 deduziu-se um deslocamento acumulado de 11 cm contemporâneo da erupção de 1563 no Vulcão do Fogo.
 

Observações


Anexos